quarta-feira, 18 de abril de 2012

14 - O Direito no Brasil Colonial - Parte I: O Brasil português (1500-1822)

Quando ocorreu a centralização do poder nas mãos dos reis, na Europa, os impostos de cada antigo feudo passaram a se concentrar na Fazenda Real ou Erário Régio, uma instituição estatal. Com esses recursos, os reis começaram a financiar a atividade comercial da burguesia no continente europeu e, depois, no ultramar.

As grandes expedições ultramarinas, como as de Cristóvão Colombo e Pedro Álvares Cabral, só foram possíveis porque as monarquias espanhola e portuguesa investiram dinheiro no treinamento de marinheiros, na construção de caravelas e naus bem equipadas, no desenvolvimento de instrumentos técnicos para a navegação, etc. Foi uma empresa caríssima, que só foi possível graças à montagem de uma estrutura centralizada de arrecadação de impostos em ambos os estados.

Quando Pedro Álvares Cabral partiu de Lisboa em 1500, o seu objetivo era atingir as Índias, região do Oriente onde eram produzidas as “especiarias” (gengibre, pimenta, canela, cravo, nós-moscada, etc.), que os portugueses trocavam por outras mercadorias e revendiam na Europa, obtendo lucros vultosos.

É importante lembrar que havia uma rota antiga para as Índias, que era utilizada principalmente pelos genoveses e venezianos. Essa rota passava pelo mar Mediterrâneo, indo até o Oriente Próximo, onde todas as mercadorias tinham que ser descarregadas, e se percorria o resto do caminho de camelo, mula ou mesmo a pé. Era uma rota difícil, dispendiosa e perigosa, e quando os turcos otomanos (já convertidos ao islamismo) tomaram o Mediterrâneo em 1453, as dificuldades para percorrê-la aumentaram ainda mais.

O português Bartolomeu Dias encontrou um novo caminho para as Índias em 1488. Seguindo esse caminho, Vasco da Gama, em 1495/1496, cruzou o Cabo da Boa Esperança (no sul da África) e chegou a Calicute, que era a cidade comercial mais importante das Índias, estabelecendo ali relações comerciais com os indianos. Vasco da Gama voltou a Lisboa em 1499, trazendo muita mercadoria: gengibre, pimenta, cravo, canela e outras especiarias. Foi recebido como herói pelo rei e pela população.

Em vista disso, o rei D. Manuel organizou uma nova expedição às Índias, chamando para ser seu capitão Pedro Álvares Cabral. Cabral tinha na época 32 anos e era um ótimo estrategista militar. Parece que o objetivo, dessa vez, não era só estabelecer relações comerciais com os indianos, mas também analisar as possibilidades de uma intervenção militar portuguesa nas Índias, ou seja, Cabral teria que, como se não quisesse nada, avaliar os riscos e estabelecer estratégias para uma provável futura invasão portuguesa de Calicute e de outros pontos estratégicos daquela região.

Pedro Álvares Cabral partiu com sua frota rumo às Índias. De acordo com o relato do escrivão Pero Vaz de Caminha, que estava na frota, na altura das ilhas Canárias um dos navios se perdeu. Cabral começou então a procurá-lo, desviando-se da rota, o que o levou ao Brasil.

A pergunta que os historiadores se colocam é a seguinte: será que esse afastamento foi só mesmo para tentar encontrar o navio que se perdeu ou foi porque Cabral sabia, ou pelo menos tinha uma idéia, de que ele encontraria alguma coisa ali? No norte, o navegador Cristóvão Colombo havia encontrado um novo território, e os portugueses sabiam disso...

Para quem não conhece a história de Colombo, ele era um navegador experiente de origem italiana – era genovês – que tentou vender uma idéia para os portugueses: a de que se eles navegassem rumo a Oeste, dariam a volta ao mundo e chegariam às Índias, porque a terra era redonda. Os portugueses, céticos, não acreditaram e resolveram investir mesmo na “Carreira da Índia” passando pelo Cabo da Boa Esperança. Colombo então foi vender a sua idéia aos reis de Castela, que acreditaram nele e financiaram a sua viagem. Colombo "descobriu" a América em 1492, só que morreu achando que tinha chegado às Índias.

No período em que Portugal não sabia ainda o que fazer com o Brasil, a única atividade econômica que os portugueses estabeleceram ali foi a extração do pau-brasil, que era uma madeira que produzia uma tintura “cor de brasa” (vermelha), de alto valor comercial na Europa, utilizada principalmente nas manufaturas de tecidos.

Por volta de 1530, o comércio com as Índias já não era tão vantajoso aos portugueses devido à concorrência com outras potências marítimas.

Os lucros obtidos por Portugal com o comércio oriental estavam diminuindo, o que, aliado à ameaça de invasão estrangeira do Brasil, fez com que o rei de Portugal decidisse colonizar o território de fato, ou seja, explorar, povoar e defender, dando um rumo econômico diferente (e mais lucrativo) para a nova colônia.

Em 1530, o rei de Portugal, D. João III, enviou ao Brasil uma expedição comandada por Martim Afonso de Sousa, que teve como objetivo percorrer a costa brasileira, reconhecendo o litoral, e dar início ao estabelecimento de um sistema administrativo que permitisse a colonização do Brasil, sistema este que ficou conhecido como "Capitanias Hereditárias". O Brasil foi dividido em 15 capitanias.

Mas o que era uma capitania hereditária? Naquela época, capitania era uma divisão territorial e política dentro de uma colônia. Era um espaço territorial delimitado que pressupunha, também, dentro de seus limites, a presença de uma autoridade administrativa. As capitanias hereditárias foram a primeira experiência de descentralização política no Brasil. Por quê? Porque cada capitania era governada por uma autoridade, o capitão donatário, escolhido pelo rei de Portugal. Não havia centralização do poder nas mãos de uma única autoridade no Brasil, mas várias autoridades, vários capitães donatários governando em territórios delimitados – por isso descentralização do poder –, uma forma de organização política muito parecida com a do sistema feudal.

A missão do capitão donatário era povoar o território da sua capitania, fazê-lo dar lucro e defendê-lo de invasores estrangeiros.

Embora o rei de Portugal estivesse acima do capitão, este não era funcionário do rei, não representava o estado, era apenas um nobre interessado em ficar rico no Brasil.

O capitão donatário tinha poderes quase absolutos sobre quem vivia na sua capitania: ele tinha poder para criar vilas, administrar a justiça e questões relativas à produção econômica; podia mandar prender, matar... Só não podia fazer tudo porque havia um documento que, de certa forma, limitava um pouco (mas muito pouco mesmo) o seu poder: a Carta de doação e Foral, que estabelecia os direitos, algumas leis, os tributos a serem pagos ao rei e ao próprio capitão, entre outras coisas. Fora isso, o poder do capitão sobre a sua capitania era imenso, quase absoluto.

O problema foi que apenas duas capitanias prosperaram: a de Pernambuco, no Nordeste, e a de São Vicente, no Sudeste. Em vista disso, em 1548 o sistema de capitanias hereditárias foi extinto e o rei de Portugal decidiu colocar no seu lugar um sistema administrativo centralizado: o Governo Geral.

A Capitania de Pernambuco deu certo porque conseguiu dar início à cultura da cana e à produção de açúcar de forma relativamente organizada. Conseguiu também defender e povoar o território.

Já a Capitania de São Vicente deu certo não por ter iniciado uma atividade econômica que se mostrasse lucrativa, porque nesse ponto o seu capitão donatário não foi muito bem sucedido – embora tenha havido ali um certo desenvolvimento da cultura canavieira –, mas ele conseguiu povoar a região de forma satisfatória e montou ali um sistema de defesa eficaz que, na opinião do rei de Portugal, deveria ser mantido para defender aquelas terras mais ao sul contra uma possível invasão estrangeira.

Temos então duas capitanias que deram certo e um Governo Geral – instituído em 1548 –, na Capitania da Bahia (por ter sido o primeiro ponto de ocupação do território brasileiro), com sede em Salvador (cidade criada em 1548 justamente para ser a sede do Governo Geral do Brasil).

O primeiro Governador Geral do Brasil foi Tomé de Souza, que veio acompanhado de outros funcionários (pagos pelo estado português) para auxiliá-lo na sua tarefa administrativa centralizadora: o provedor-mor, responsável por assuntos de finanças, ligados à fazenda (impostos, sobretudo); o capitão-mor, responsável pela defesa da colônia; e o ouvidor-mor, responsável pela aplicação da justiça do rei.

Tomé de Souza foi Governador Geral do Brasil de 1549 até 1553, e foi a partir do seu governo que se desenvolveu a indústria açucareira no Brasil.

Por que o açúcar? Primeiro porque os portugueses não tinham conseguido encontrar ouro e prata naquele momento inicial da colonização e precisavam de uma atividade econômica que fornecesse mais riqueza ao estado português do que a simples extração de pau-brasil (o açúcar era uma especiaria na Europa). Depois, porque eles já dominavam as técnicas de produção de açúcar, que eram já empregadas em outras possessões portuguesas, como na ilha da Madeira e nos Açores.

Só que eles precisariam de uma mão-de-obra adequada, porque o índio, na visão dos portugueses, não era bom escravo.

Foi aí que teve início o tráfico negreiro para o Brasil.

A África, na época dos descobrimentos, era formada por várias tribos (nações) diferentes de africanos. Os portugueses, já no início do século XV (anos 1400), começaram a estabelecer contato com essas tribos africanas e logo perceberam que a escravidão era uma instituição naturalmente aceita entre elas. Os portugueses, logicamente, tiraram proveito disso, comprando escravos dos próprios africanos.

O que acontecia era que essas tribos entravam em guerra umas com as outras e as tribos vencedoras escravizavam os prisioneiros das perdedoras. Esses prisioneiros eram, então, trocados no litoral por mercadorias que os portugueses traziam: armas, tecidos, rolos de tabaco, vinho, aguardente, roupas usadas, chapéus, etc.

Logo que desembarcavam no litoral brasileiro, os escravos eram reunidos num armazém e depois separados em lotes para serem vendidos.

Foi assim, então, que se introduziu no Brasil o sistema escravista, como um acessório da economia açucareira.

No final do século XVII, diante da crise dos engenhos de açúcar no nordeste brasileiro, os portugueses começaram a investir na produção manufatureira em Portugal (de tecidos, sapatos, roupas, etc.), para ver se com isso a economia portuguesa se reerguia. Só que essa iniciativa acabou não dando certo e foi abandonada.

Enquanto isso, no Brasil, os paulistas, colonos da capitania de São Vicente, davam início às suas expedições pelo interior do Brasil. Encontraram muito ouro na região que, mais tarde, foi chamada de Minas Gerais, no final do século XVII, entre 1693 e 1695; depois, em Mato Grosso (1719) e, mais tarde, em Goiás (1726). A capitania de Minas Gerais foi criada em 1720.

O rei de Portugal viu aí a chance de resolver todos os problemas econômicos de Portugal e mandou logo promulgar, em 1702, o Regimento dos Superintendentes, Guardas-mores e Oficiais Deputados para as Minas de Ouro (instrumento de centralização e controle). Esse regimento se manteria até o término do período colonial, apenas com algumas modificações.

Vamos agora dar um salto para o ano de 1820. Nessa época, a elite brasileira era formada por grandes proprietários rurais, em particular os de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Contava com a simpatia de altos funcionários, militares e também comerciantes brasileiros e estrangeiros, que queriam que o Brasil fosse livre para comerciar com a Inglaterra e outros países, sem depender da intermediação portuguesa, que era prejudicial aos seus interesses. Essa elite tinha consciência da precária situação de Portugal (devido à crise do ouro e ao seu enfraquecimento político após a fuga da família real para o Brasil, em 1808) e não queria depender de um país em decadência. Queria, na verdade, um Brasil independente, livre para vender seus produtos – principalmente o café – a qualquer país que pudesse pagar por eles.

Já a elite portuguesa (no Brasil e em Portugal), formada principalmente por comerciantes portugueses, queria um Brasil colonial, submetido a Portugal e aos interesses de sua burguesia.

Em resumo, a elite brasileira queria o liberalismo econômico, a livre concorrência, e a elite portuguesa queria a volta do monopólio comercial português (abolido pelo Príncipe D. João em 1808, quando veio para o Brasil), porque só assim ela teria condições de crescer economicamente.

Mas no fundo, podemos afirmar, o que a elite brasileira queria mesmo era poder. Ela queria participar das tomadas de decisões, governar o Brasil de fato, para poder conduzir a política a seu favor, a favor do Brasil cafeeiro, agro-exportador. Ela não queria o retorno do regente D. Pedro (filho do agora rei D. João VI) para Portugal, porque via nele a possibilidade do Brasil se tornar uma nação independente e liberal, não só economicamente – como já estava sendo, desde a abertura dos portos em 1808 –, mas também politicamente.

Foi com esse objetivo que a elite brasileira apoiou a resistência de D. Pedro em voltar para Portugal e, depois, em 1822, o movimento de Independência.

Em 7 de setembro de 1822, D. Pedro declarou a independência do Brasil e passou a ser o seu imperador (rei).

Tem início aí o Brasil Império (1822-1889)

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